As crianças precisam de mais horas de sono do que se imagina. Elas são fundamentais para a saúde e o desenvolvimento.
Entrevista com o médico antroposófico Derblai Sebben, que estudou Ritmos Biológicos na USP (Universidade de São Paulo) e Medicina do Sono na UNIFESP (Universidade Federal de São Paulo), para saber quais são os principais erros que os pais cometem em relação ao sono dos filhos. Deixá-los acordados até tarde, não manter horários de rotina e supor que a criança não dorme “porque é assim mesmo” estão entre os maiores enganos. Mas o pior dos problemas é deixar a criança dormir menos do que ela precisa – e elas precisam de muitas horas de sono por dia. Confira.
iG: Quais os erros mais comuns que os pais cometem em relação ao sono dos filhos?
Derblai Rogério Sebben: O principal problema da vida moderna é a falta de ritmo – ou seja, a falta de rotina. A vida moderna dos pais faz com que a gente viva correndo. A pessoa acorda atrasada de manhã, corre para tomar café e passa o resto do dia ansiosa. Isso incomoda a criança facilmente. Elas sofrem com essa falta de rotina, com a vida apressada dos pais. As crianças ficam agitadas, essa falta de ritmo leva à hiperatividade da criança. E isso geralmente tem relação direta com a falta de rotina dos adultos.
As crianças precisam de ritmo. Ritmo é igual à saúde. Se você quer que alguém se desenvolva com mais saúde, a estratégia é cuidar dos ritmos.Comer na hora certa, dormir na hora certa, criar e seguir uma rotina. Se os pais não mantêm uma rotina para si, isso passa para as crianças – e elas adoecem, psicológica e fisicamente.
Outro erro comum dos pais é achar que as crianças já nascem com problemas de sono. As mães me falam: “meu filho não dorme, desde bebê ele é assim”. Nada disso! A não ser que a criança nasça com um problema neurológico mais grave, sempre explico para elas que a “programação genética” da criança é ela dormir quando o sol se põe e acordar quando o sol nasce. Muitos pais se enganam e acham que o filho tem um problema, mas é só falta de rotina.
iG: Muitos pais estabelecem uma rotina em que a criança vai dormir mais tarde porque eles chegam tarde do trabalho, e querem passar algum tempo com o filho. Como resolver este dilema? É melhor ficar sem ver os pais no dia a dia?
Derblai: Os estudos mostram que, durante o horário das 8 às 10 horas da noite, a criança se beneficia muito mais do sono do que da presença dos pais. Mas isso pode ser adaptado, claro. Se querem passar um tempo com os filhos, seria mais razoável que, ao chegar em casa, os pais tivessem uma conduta que vá tranquilizando a criança. Fazer um lanchinho leve, colocar na cama, ler uma história são opções melhores do que chegar e brincar, fazer bagunça, estimular. A criança poderia dormir às 8 ou 9, mas acaba dormindo às 10 horas da noite, porque os pais chegam e estimulam demais. As mães e os pais devem se lembrar que às 8, 9 da noite, eles próprios já estão cansados também. O melhor é que os filhos já estejam dormindo quando os pais chegam em casa, se eles chegam tarde. E, uma vez por semana, os pais podem se comprometer a chegar mais cedo e ficar com a criança antes dela dormir.
iG: Qual a importância do sono na infância?
Derblai: Até os 18, 20 anos de idade, o organismo da criança ou do adolescente está em formação. Enquanto nós, adultos, dormimos para regenerar os órgãos, a criança dorme para formá-los. Órgãos, ossos, músculos – o corpo inteiro delas está em desenvolvimento, crescimento. O principal deles é o cérebro. O sono tem participação fundamental no desenvolvimento neurológico. A criança que dorme bem forma melhor seu cérebro, o que influencia também no comportamento. Dormir bem previne o déficit de atenção e a hiperatividade.
iG: Quanto tempo de sono por dia uma criança, em cada fase, deve ter?
Derblai: Quando recém-nascido, o ideal é dormir de 15 a 18 horas por dia. Na fase de lactente, até os dois anos, a recomendação é de 13 a 15 horas. Os pré-escolares (até 5 anos) precisam de 12 a 13 horas diárias de sono. A criança em idade escolar (de 5 a 11 anos), precisam de 10 a 12 horas e o adolescente, de 9 a 10 horas.
iG: Qual a melhor hora para as crianças irem para a cama?
Derblai: Por volta das 7, 8 horas da noite, a produção do hormônio melatonina, que regula o sono, sobe – e a adrenalina desce. Esse é o horário em que é mais fácil a criança dormir. Mais fácil do que às 10 horas da noite, quando se inverte a produção.
iG: Quais os problemas que a falta de sono acarreta para as crianças?
Derblai: A criança que dorme mal pode ter problemas de imunidade – fica resfriada com mais frequência, por exemplo. Quando dormem mal, os pequenos não ficam como a gente, em ritmo lento. Eles ficam elétricos e podem ter problemas de comportamento.
iG: Quais as dicas para a hora de colocar uma criança para dormir?
Derblai: O sono é uma questão biológica. Quem dorme é o corpo, o cérebro tem que ser orientado para dormir. Como induzir o cérebro ao sono? As palavras-chave são escuro e silêncio. Esta dupla dispara a liberação da melatonina. Outras dicas práticas são ter um horário fixo e criar um ambiente apropriado para o sono. Fazer um ritual é uma boa ideia: pode acender uma velinha, deixar uma luz de abajur suave, contar uma história, fazer uma massagem – não massagem especializada, apenas um toque agradável. O importante do ritual é sua repetição. E ele deve ser bem simples. Quanto mais simples para a mãe, melhor para a criança. Quem quiser saber mais sobre o assunto, recomendo a leitura de dois livros muito bons sobre o tema: “Bom sono” (editora Celebris), de Richard Ferber, e “Nana Nenê – Como resolver o problema de insônia de seu filho” (editora Martins Fontes), de Eduard Estivill.
iG: E o que não fazer na hora de dormir?
Derblai: Colocar para dormir com televisão ligada, DVD ou música não são atitudes recomendáveis.